Súmula: A definição do que é o “lírico” e o seu estatuto como gênero literário sempre foram objeto de debate e incerteza na literatura ocidental, nunca tendo recebido uma expressão unívoca e sistemática até o Romantismo. Sua primeira definição é contingencial, obtida por exclusão, a partir da Poética de Aristóteles: lírica é poesia não-mimética. O fato de apenas as formas poéticas miméticas – que imitam ações – terem sido contempladas por Aristóteles teria relegado a lírica a segundo plano na teoria literária ocidental até o momento em que passa, no Romantismo, a fazer parte de uma tríade fundamental com a épica e o drama, e uma nova e poderosa abordagem sobre o sujeito permite entender a lírica também como gênero mimético, vendo nela a mimese de uma experiência subjetiva. O curso tomará esse momento do Romantismo como ponto de chegada e buscará analisar o surgimento da lírica no mundo antigo e a sua trajetória pré-romântica, acompanhando seu desenvolvimento e suas metamorfoses a fim de reconhecer quais aspectos centrais persistem nesta longa tradição.
Programa:
1. A noção de gênero nos estudos literários. O gênero como categoria transperiódica. Visões contemporâneas dos gêneros e propostas de definição de Lírica. O lugar da lírica na Estética de Hegel.
2. Arqueologia da Lírica: Grécia Arcaica.
3. Iambo, Elegia, Mélica. Arquíloco, Safo.
4. Platão e Aristóteles (Poética).
5. Arqueologia da Lírica: Grécia Helenística. Calímaco. A Crestomatia de Proclo e os fragmentos de uma primeira teoria da lírica.
6. Arqueologia da Lírica: Roma. Catulo, Propércio, Horácio, Ovídio.
7. Horácio (Arte Poética). Quintiliano (Instituições Oratórias).
8. Antiguidade Tardia. Retórica e Poesia. Do Sublime, de Ps-Longino.
9. Dante, Petrarca e a Lírica em vernáculo.
10. Fechamento e Análise do Percurso: retraçando o conceito de Lírica.
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