Milton Santos em momento de descontração
Fonte: Site oficial Milton Santos
Disponível em: http://miltonsantos.com.br/site/biografia/
Ricardo de Sampaio Dagnino
Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Campus Litoral Norte
Tramandaí, outubro de 2020.
Esta é uma compilação das publicações sobre a população negra e o racismo no Brasil e no mundo com autoria ou co-autoria de Milton Santos. Este material foi organizado objetivando resgatar textos e entrevistas gravadas em momentos diferentes. Para maiores informações visite: https://professor.ufrgs.br/dagnino/documents
2. Milton Santos e o negro no mundo
3. Milton Santos e o negro no Brasil
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O professor Milton Santos teve uma vida longa e produtiva. Viveu 75 anos (1926 a 2001) e recebeu um dos maiores prêmios que um geógrafo poderia receber, o prêmio Vautrin Lud, em 1994, considerado o "Nobel da geografia". (SANTOS; LEVY, s/d).
Uma biografia sintetizada poderia ser a seguinte:
Milton Almeida dos Santos nasceu em 3 de maio de 1926, em Brotas de Macaúbas, no interior do estado da Bahia, Brasil.
Formou-se bacharel em Direito pela Universidade Federal da Bahia (1948) e doutorou-se em Geografia, Université de Strasbourg, França (1958), sob orientação do Prof. Jean Tricart.
Milton Santos durante a formatura
Fonte: Site oficial Milton Santos - Disponível em: http://miltonsantos.com.br/site/biografia/
Desde sua formação profissional, atuou paralelamente no meio acadêmico, como professor da Universidade Católica de Salvador e da Universidade Federal da Bahia, e exerceu atividades públicas, como jornalista e redator do jornal A Tarde (1954-1964).
Em 1964, devido ao golpe militar e a instabilidade política e social, inicia uma carreira internacional a partir da França, como professor convidado nas universidades de Toulouse, Bordeaux e Paris-Sorbonne.
Durante a década de 1970 recebe diversos convites em outros países atuando em diversas instituições: no MIT (Massachusetts Institute of Technology – Boston), nas universidades de Toronto (Canadá), Caracas (Venezuela), Dar-es-Salam (Tanzânia), Columbia University (New York).
Em 1977, retorna ao Brasil e fica dois anos sem conseguir voltar a ensinar em universidades brasileiras. Finalmente consegue na Universidade Federal do Rio de Janeiro (1979 a 1983) e na Universidade de São Paulo (1983-1997).
SANTOS, Marie-Helene; LEVY, Jacques. Milton Santos -Biografia. http://miltonsantos.com.br/site/biografia/
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Milton Santos publicou o artigo "As exclusões da globalização: pobres e negros" (SANTOS, 1998) na revista Thoth, Escriba dos Deuses: Pensamento dos Povos Africanos e Afrodescendentes, uma publicação do gabinete do senador Abdias Nascimento que circulou entre janeiro de 1997 e dezembro de 1998.
Graças ao convênio com a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), como parte do Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça, o Senado Federal reimprimiu os seis volumes da revista em 2013. Este acervo encontra-se digitalizado e disponível online no site do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro Brasileiros (IPEAFRO): https://ipeafro.org.br/acervo-digital/leituras/obras-de-abdias/revista-thoth/.
SANTOS, Milton. As exclusões da globalização: pobres e negros. Thoth, Brasília, n. 4, p. 147-160, 1998. Disponível: https://ipeafro.org.br/acervo-digital/leituras/obras-de-abdias/revista-thoth/
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Como parte das celebrações do Dia Nacional da Consciência Negra e da imortalidade de Zumbi dos Palmares, o Centro Cultural José Bonifácio, situado na cidade do Rio de Janeiro, promoveu nos dias 17 e 18 de novembro de 1997 a Kilunge – Primeira Feira do Livro Afro-Brasileiro.
Durante o evento Milton Santos falou sobre "As exclusões da globalização: pobres e negros". A palestra foi transcrita pela equipe da revista Thoth, sob responsabilidade do senador da república Abdias Nascimento e editada em Brasília. A íntegra da palestra foi publicada no ano seguinte e está no n. 4, p. 147-160, 1998, disponível: https://ipeafro.org.br/acervo-digital/leituras/obras-de-abdias/revista-thoth/.
Deste texto destaco (SANTOS, 1998, p. 155):
A herança nos traz, num País como o Brasil, um modelo cívico subalterno ao modelo econômico. Sempre foi assim. Em todos os tempos, o modelo econômico subordina o modelo cívico, basta ver agora as crises da economia brasileira e a palavra de ordem, dita de cima, segundo a qual quem não está de acordo está contra o Brasil, e a frase, dita até nas oposições, segundo a qual temos que ajudar o modelo. Isso está ligado a esse peso do modelo econômico em oposição ao modelo cívico. Creio que a história dos negros teria muito a lucrar se fosse reescrita a partir de uma visão que propusesse uma nova escrita com base na questão do modelo cívico.
A subalternidade do modelo cívico atrofiou, por exemplo, o debate da previdência no Brasil, assim como atrofia o debate da questão da função pública. Esse debate se empobreceu no Brasil porque se pede aos velhos que cuidem de si próprios, e a sociedade aceita essa demanda hedionda, facilitando a instalação entre nós do projeto segundo o qual os brasileiros assistirão tranquilamente ao genocídio da população – porque é isso que se está preparando. O abandono programado dos velhos, o abandono programado dos pobres, o abandono programado dos negros são três genocídios que estão inscritos no processo político atual e para o qual as vozes dos partidos de oposição são praticamente nulas, porque aceitam o debate nos termos em que está colocado.
Em 1998, Milton Santos deu uma entrevista para a revista Caros Amigos, que foi digitalizada e foi publicada em 2016 no site do Portal Geledés (Entrevista, 2016[1998]) e os entrevistadores foram: Marina Amaral, Sério Pinto de Almeida, Leo Gilson Ribeiro, Georges Bourdoukan, Roberto Freire, João Noro, Sérgio de Souza:
Sérgio de Souza – Todos os negros têm medo?
Milton Santos – Todos têm. Posso fazer uma confissão? Tenho uma certa simpatia por esse rapaz, o Pitta. Esse ataque todos os dias, isso me choca, me dói também. Nunca votaria nele, não vou visitá-lo até que acabe o governo dele, mas no fundo sou solidário, porque sei que uma parte disso vem do fato de ele ser negro. Pisado como ele é pisado todos os dias, quando não se faz isso com ninguém!
Alguns anos depois, em 2000, escreveu para a Folha de São Paulo um texto "Ser negro no Brasil hoje: Ética enviesada da sociedade branca desvia enfrentamento do problema negro" (SANTOS, 2000):
"No caso do Brasil, a marca predominante é a ambivalência com que a sociedade branca dominante reage, quando o tema é a existência, no país, de um problema negro. Essa equivocação é, também, duplicidade e pode ser resumida no pensamento de autores como Florestan Fernandes e Octavio Ianni, para quem, entre nós, feio não é ter preconceito de cor, mas manifestá-lo. Desse modo, toda discussão ou enfrentamento do problema torna-se uma situação escorregadia, sobretudo quando o problema social e moral é substituído por referências ao dicionário. Veja-se o tempo politicamente jogado fora nas discussões semânticas sobre o que é preconceito, discriminação, racismo e quejandos, com os inevitáveis apelos à comparação com os norte-americanos e europeus. Às vezes, até parece que o essencial é fugir à questão verdadeira: ser negro no Brasil o que é? Talvez seja esse um dos traços marcantes dessa problemática: a hipocrisia permanente, resultado de uma ordem racial cuja definição é, desde a base, viciada. Ser negro no Brasil é frequentemente ser objeto de um olhar vesgo e ambíguo. Essa ambiguidade marca a convivência cotidiana, influi sobre o debate acadêmico e o discurso individualmente repetido é, também, utilizado por governos, partidos e instituições." (SANTOS, 2000)
SANTOS, M. Ser negro no Brasil hoje: Ética enviesada da sociedade branca desvia enfrentamento do problema negro. Folha de São Paulo, São Paulo, domingo, 07 de maio de 2000. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs0705200007.htm
Entrevista explosiva com Milton Santos. Portal Geledés, 2016 [1998]. (Publicada originalmente na revista Caros Amigos). Disponível: https://www.geledes.org.br/entrevista-explosiva-com-milton-santos/
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